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Que o Suns não estava dando certo, isso todo mundo podia ver. O ataque não resistiu à saída do técnico D’Antoni e a defesa não ficou lá essas coisas com seu substituto, o Terry Porter. Como o Denis bem disse há um tempo, o Suns sentiu uma saudade brutal da correria que era parte da identidade do time. É verdade que o estilo falhava justamente contra os grandes times, contra as grandes defesas, nos momentos mais decisivos. Mas no resto do tempo – e, portanto, na enorme maioria do tempo – o Suns de D’Antoni chutava traseiros, ganhava os jogos com imensa facilidade, abria sorrisos nas crianças e atraiu uma grande massa de gente ao esporte. Com a chegada de Shaq, o objetivo era continuar a correria mas ter uma arma para o basquete de meia quadra, justamente o maior problema nas partidas contra o Spurs. O próprio Shaq disse que poderia correr numa boa, que não seria nenhum problema e que seu jogo lento era, até então, escolha técnica. Mas a empreitada não deu muito certo, optou-se por uma mudança de ares e o D’Antoni foi plantar batata.
A temporada acabou de começar e todo mundo já está visivelmente descontente com o novo técnico Terry Porter. Ter um ataque mais lento e cadenciado depois de passar anos com D’Antoni deve ser intragável, é como beber Fanta Uva depois de anos de vinhos caríssimos. Ao contrário da crença popular, o esquema de D’Antoni não é uma porra-louquisse sem critério, mas sim um detalhado e complexo sistema que cria movimentação de bola, criatividade e liberdade ofensiva. Agora todo mundo se sente preso, num ataque chato e que não é nem de longe tão efetivo quanto era antes. A defesa melhorou com o Terry Porter, isso é fato, mas já se fala em Phoenix sobre a necessidade de voltar a correr, de recuperar a identidade que o time possuia. Nash não rende tanto no novo esquema tático, Boris Diaw era obrigado a jogar como um simples ala, plantado no garrafão, ao invés de poder utilizar a versatilidade que um dia – ah, bons tempos aqueles – lhe deu o prêmio de jogador que mais evolui na temporada, e o Leandrinho, mesmo com todos os problemas psicológicos e familiares pelos quais vem passando e que com certeza influenciam seu jogo, é muito nitidamente o mais incomodado com a nova mentalidade do ataque do Suns.
É muito engraçado, então, que o novo técnico que veio justamente para dar ênfase na defesa tenha que inverter tudo e focar o ataque, que não está funcionando. Com essa mentalidade, o Suns mandou seu melhor defensor de perímetro, Raja Bell, e um jogador versátil e mal utilizado, Boris Diaw, em troca de um jogador puramente ofensivo que foi o líder em bolas de 3 pontos convertidas na temporada passada, Jason Richardson.
Está aí uma troca que deixaria Mike D’Antoni orgulhoso, mandar às favas a defesa e versatilidade (o D’Antoni é famoso por usar o mínimo de jogadores possível) e conseguir um jogador que vai melhorar ainda mais o ataque. Espera, espera, isso não é um tanto absurdo? O ataque estava bom, a defesa fedia, aí vem um cara pra cuidar da defesa, o ataque fica uma porcaria, e aí eles trocam por alguém que faça mais pontos? Sou só eu ou o Suns parece que se arrepende o tempo inteiro, fica abandonando e recuperando suas mentalidades, e não consegue decidir se corre, se fica, se defende, se ataca, se segura o Tchan ou se rala na boquinha da garrafa?
Eu sempre bato na tecla de que todo time precisa ter uma identidade. O jogador precisa entrar em quadra sabendo qual é o maldito plano, o que diabos ele tem que fazer. Se uma hora o plano é correr, na outra é defender, depois fica correr de novo, não tem como haver ritmo ou consistência na produção dos jogadores. Pior ainda é as mensagens contraditórias que a equipe técnica acaba passando para o elenco: “Gente, o negócio agora é esquecer o D’Antoni, vamos aprender a defender porque defesa é que ganha jogos. Aliás, fizemos uma troca pelo Jason Richardson, ele chega amanhã.” Hã? É tipo um cara dizer que quer fazer limonadas e ficar comprando laranjas.
A troca também mandou para o Suns uma escolha de segundo round no draft e o Jared Dudley. O Dudley estava sendo titular no Bobcats porque o Larry Brown estava tentando até a mãe dele para fazer dupla de garrafão com o Okafor, mas não há ninguém que preste no elenco. No entanto, para jogar apenas no garrafão e ser carregador de piano, obedecer, pegar rebotes e ficar quieto, Dudley vai se encaixar bem melhor do que o Diaw. O francês, por sua vez, é muito mais talentoso e cheio de recursos, mas fica difícil imaginar ele sendo o parceiro de garrafão de que Okafor necessita. Minha suspeita é que o Larry Brown não vai gostar da idéia de usar o Diaw e os problemas debaixo da cesta vão continuar os mesmos. O Raja Bell deve se dar melhor, mas como o Denis bem me disse, com Bell e Gerald Wallace o Bobcats está bem para marcar qualquer time, mas nunca vai fazer mais de 80 pontos num jogo sequer. Aliás, não vejo como o Bobcats vai conseguir marcar 5 pontos sequer, acho que o Larry Brown surtou e quer ver quantos times ele consegue acabar de afundar junto com sua carreira.
O Terry Porter também está afundando no Suns, mas agora ganha uma nova tentativa. Acho que sua presença, pra ser sincero, apenas demonstra como o time de Phoenix era limitado, uma ferida com um curativo bem feito que segurava as coisas nos trinques. Com o cutucão que o Porter deu, a defesa não melhorou (sangramento eterno) e o ataque desmantelou, expondo o ferimento. Olhar o Knicks de agora talvez torne isso ainda mais claro. O time é limitadíssimo, incapaz de jogar na defesa, fadado ao fracasso eterno, mas D’Antoni colocou um curativo e agora a equipe faz mais de 100 pontos por jogo, movimenta a bola, joga coletivamente. Ele é, como diria o Wolverine, o melhor no que faz (SNIKT!), o Mestre dos Magos do ataque, mas não dá pra concertar tudo. Às vezes, querer arrumar todos os aspectos leva o time a desmoronar por completo e perder sua identidade.
Agora temos um Suns que resolveu voltar a correr, com um Jason Richardson que vai atacar a cesta e arremessar milhões de bolas de três. Bem, se essa era a intenção, então por que não manter o D’Antoni? O Suns agora é um time que nem se pauta pelo passado e nem se foca no futuro, completamente perdido no tempo. Resta nossa torcida de que eles encontrem um meio-termo, que Terry Porter encontre uma voz própria, e que o ataque volte, no mínimo, a empolgar. Antigamente o Suns perdia mas levantava a torcida, o que é bem melhor do que perder e ainda parecer o Fábio Puentes, dizendo “Dorme, dorme, dorme, dorme!”. Os ânimos por lá andam de fim de feira, todo mundo insatisfeito e a torcida preferindo ir jogar Pokémon. Supostamente, a troca deveria dar um ânimo na equipe, colocar sangue novo e impor um ritmo mais veloz, mas não deu muito certo a princípio: Nash e Raja Bell eram melhores amigos e o canadense está legitimamente desolado, se dizendo incapaz de compreender que isso é “um negócio” como todos os discursos padrão de jogadores trocados. Agora, como se não bastasse, o Suns tem que se preocupar com o descontentamento de Nash, a depressão de dois amigos desfeitos, e todo mundo que se lembra do Mobley e do Steve Francis sabe que, às vezes, um dos lados nunca mais se recupera (Mobley, aliás, que se aposentou com problemas no coração – típico de quem passa uns tempos jogando pelo Clippers).