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O Sérgio Mallandro era um renomado apresentador de programas infantis que fez história entre a criançada com a lendária “porta dos desesperados”, em que um fedelho tinha que escolher entre três portas para ver se ganhava uma bicicleta, um videogame ou um gorila com uma torta – algo que me fascinava simplesmente por não fazer muito sentido. Sua fama lhe garantiu par romântico com a Xuxa (infelizmente para ele, foi depois dela abandonar sua carreira na indústria pornô) e ele até chegou a assumir o programa dela na Globo quando ela deixou de aparecer uns tempos, provavelmente porque estava com diarréia. Como é que esse Sérgio Mallandro se tornou um apresentador de programa de pegadinhas com gostosinhas rebolando no fundo (as “Mallandrinhas“) eu nunca entendi. O que é preciso acontecer para um ser humano decair tanto, chegar no fundo do poço e, agora, estar desempregado e tentar se eleger deputado enquanto continua gritando “glu glu glu glu”?
O mesmo mistério se aplica ao Adam Morrison. Um jogador espetacular no basquete universitário, excelente arremessador, cheio de identidade com seu cabelinho característico e bigode ridículo, dotado de senso de humor e até exemplo de vida, vencendo a diabetes desde os 13 anos de idade e ainda assim conseguindo praticar um esporte em alto nível. Não tinha como não gostar do Adam Morrison, é como não gostar de koalas – são engraçadinhos, inofensivos, esquisitos, quem seria capaz de lhes fazer algum mal? Desde o começo sempre tive um “Complexo de Drew Barrymore” com o Adam Morrison (gostar de alguém e não fazer a menor idéia do motivo, para vocês que não estão por dentro do jargão bolapresístico). Quando foi draftado pelo Bobcats, por quem tenho aquele apreço que a gente tem por um irmãozinho mais novo, fiquei feliz e certo de que ele se daria bem por lá. Vi um jogo, dois jogos, três jogos. Mesmo quando o Adam Morrison jogava bem e acertava seus arremessos, para a minha surpresa, ainda assim ele fedia. Tentei disfarçar, tentando me convencer de que ele pegaria o jeito com o tempo, mas algo ali estava muito errado. Não é que ele não corresse no contra-ataque ou não fosse capaz na defesa, como o Carmelo Anthony. Ele simplesmente comprometia em todos os aspectos do jogo! Nunca ia para o ataque mas também não voltava para a defesa, era como se ele sumisse num vórtex temporal, como se ele ficasse preso num triângulo das bermudas presente no meio da quadra. De tão lento que era em quadra, cheguei a achar que a minha conexão ruim da internet estivesse fazendo com que o jogo passasse em câmera lenta. Seus momentos de titular foram poucos, porque além de estragar qualquer pretensão de se jogar de maneira física, veloz ou defensiva, rapidamente o Morrison parou de acertar seus arremessos. Como eu sou um homem livre, parei de assistir a porcaria do Bobcats e me limitei a desejar o melhor para o Morrison, que ele aprendesse a jogar aquele troço chamado basquete. Mas no fundo, mesmo que eu não admitisse nas conversas por aí, eu sabia que ele não tinha nenhuma chance.
Sua carreira foi daí pra baixo. Os minutos foram diminuindo até que ele contundiu o joelho na pré-temporada e não jogou durante sua segunda temporada inteira. Voltou apenas agora, com o cabelinho cortado, quase irreconhecível, sentado lá no fundo do banco, e tiveram que passar um paninho nele para tirar a poeira e as teias de aranha quando o Gerald Wallace sofreu a tentativa de assassinato. Nem preciso dizer que o Adam Morrison não conseguiu fazer nada com essa oportunidade, suas deficiências são muito maiores do que qualquer qualidade que ele venha a ter. Agora, Morrison acabou de ser trocado para o Lakers, junto com Shannon Brown, pelo Radmanovic. Aí está, a decadência de um homem, uma jornada do céu para o inferno, da “porta dos desesperados” para a TV Gazeta, de ser uma estrela universitária para, por fim, ser trocado por um zé-ninguém como o Radmanovic. Façamos um minuto de silêncio em sua homenagem, em respeito a um homem que, além do bigodinho, ficou famoso por chorar quando foi eliminado na NCAA e por ser garoto propaganda da porcaria do NBA Live.
O comercial é bacanudo, o Adam Morrison diz que não se envergonha de chorar em rede nacional de televisão, que mais pessoas deveriam chorar e ter esse tipo de intensidade, e que quando ele entrasse na NBA mais gente iria chorar. Um pouco egocêntrico, mas bizarramente profético: o Michael Jordan está chorando por ter gastado uma terceira escolha nele, e o Larry Brown estava chorando porque ele não gosta de ninguém, principalmente alguém que não sabe nem fingir que está defendendo. O Larry Brown tentou trocar o Raymond Felton, se livrou do Jason Richardson, do Matt Carroll, proibiu o Sean May de jogar até que ele perca uns quilos e alcance o peso ideal, e agora mandou o Adam Morrison plantar batata. Com ele não tem conversa, quem não se encaixa no esquema arruma outro emprego, e já faz tempo que o Larry Brown quer um banco de reservas decente. Com Raja Bell e Boris Diaw, o armador DJ Augustin melhorou o banco, e o Diop veio do Mavs para ser alguém bípede capaz de jogar no garrafão, e ainda de brinde dá uns tocos. A chegada do Vladmir Radmanovic segue a mesma linha: é um jogador alto, capaz de pegar um par de rebotes, e pode jogar nas duas posições de ala que são a maior deficiência do Bobcats no momento, mesmo quando o Gerald Wallace voltar. Ou seja, eles mandam um jogador que fede e se mostrou incapaz de produzir qualquer coisa em quadra e em troca recebem um jogador que também fede mas pelo menos tem tamanho e é mais versátil, podendo jogar em mais de uma posição.
É ridículo, tanto para o Morrison quanto para o Radmanovic, ver por quem estão sendo trocados. Nada poderia ser maior atestado de que os dois fedem, pior só se fossem trocados pelo Kwame Brown. Mas sem dúvida o Radmanovic é o que se deu melhor nessa, porque vai ter mais minutos de quadra tapando buracos no Bobcats. Mesmo se ele não defender nem ponto de vista, vai entrar em quadra mesmo assim por ter dois braços e duas pernas. No Lakers, não tinha mais chances de entrar em quadra. Desde que o técnico Phil Jackson resolveu que o Lakers precisava rodar mais a bola, Radmanovic perdeu seu lugar no quinteto titular e o Luke Walton assumiu a posição. Sem a necessidade de seus arremessos de fora (que o Walton substitui razoavelmente bem, e com o Sasha “The Machine” Vujacic sendo o real especialista na função – pelo menos quando joga em casa, já diria o Denis), o Phil Jackson prefere usar o Josh Powell para jogar no garrafão ao invés do Radmanovic. O Powell se encaixa melhor na posição simplesmente porque ele é um cover do Ronny Turiaf, que foi embora do Lakers para sentar no banco do Warriors e ficar rico. Os dois são parecidos em tamanho, porte físico, e o Powell até faz questão de usar as mesmas trancinhas no cabelo e arremessar as bolas com a mesma mecânica de pulso! Nunca achei na minha vida que fosse ver um cosplayer de Turiaf (já me bastava a Mallu Magalhães ser cosplayer de folk.)
Assim que o Luke Walton virou titular, o Radmanovic ficou revoltado porque pelo jeito o Phil Jackson sequer falou com ele, não avisou nada, só tacou ele no limbo. O técnico zen nunca gostou muito do Radman mesmo, parecia louco para se livrar do rapaz. Agora conseguiu, mesmo que não vá também usar o Adam Morrison, que muito provavelmente não vai ter qualquer espaço na equipe. É até capaz dele se acertar no Lakers, não errar mais arremessos, se beneficiar com o triângulo ofensivo, mas eu teria que ser burro demais para acreditar nisso. Já faz tempo que eu tentei me enganar dizendo que uma hora ele ia dar certo, já ficou óbvio que o Adam Morrison não vai pegar o jeito nunca. Seus minutos serão os mesmos que eram do Radmanovic, ou seja, final de jogos muito ganhos (ou muito perdidos) e tapar buracos quando o Luke Walton e o Odom se contundirem. A troca não muda em nada a situação atual do Lakers, mas muda o futuro: é tudo questão de salário.
O Radmanovic e o Morrison ganham praticamente a mesma coisa, por volta dos 6 milhões, o que é grana demais para dois caras que fedem pra burro. O Lakers está arrumando a cagada o mais rápido possível, porque o contrato do Morrison só continua na temporada que vem se o time escolher, enquanto o do Radmanovic é escolha do próprio jogador. Assim, o Lakers garante que vai ter uma grana sobrando para a temporada que vem e não vai sentir falta nenhuma de dois arremessadores que não defendem e nem nunca deram certo, é tchau e muito obrigado. Mas a troca não termina aí, porque a graça toda está no brinde, tipo aqueles anéis ou relógios de plástico que vêm “de grátis” na paçoca: trata-se do Shannon Brown. No Cavs, teve alguns problemas de lesão, foi trocado para o Bulls, perdeu o emprego e foi parar no Bobcats. Sempre ignorado, sempre invisível, mas a verdade é que ele pode ser mais útil do que qualquer bigodinho por aí. Ele é capaz de bater para dentro e criar espaços, finaliza bem no garrafão e cava faltas com certa habilidade. É forte e explosivo, só fede um pouco nos arremessos e nos fundamentos, mas tem gente muito pior por aí enfiando dinheiro até nas orelhas para ser titular. É bem capaz de ganhar uns minutinhos no Lakers de vez em quando, principalmente se o Fisher morrer de repente (nunca se sabe).
A troca, no fundo, é completamente esquecível – principalmente porque o melhor jogador da troca, o Radmanovic, vai para um time do qual ninguém se lembra mesmo. Exatamente por isso, me lembra de uma outra troca que aconteceu recentemente: o Magic mandou Keith Bogans para o Bucks em troca do Tyronn Lue.
A troca chega a ser engraçada porque os dois times estão tentando tapar buracos criados por contusões, então se a temporada tivesse metade do tamanho, os dois jogadores nunca teriam mudado de time. Por um lado é o Bucks tentando colocar alguém no lugar do Michael Redd, contundido pelo resto da temporada, mas como o Bogut arrebentou as costas (fratura por stress, temporada muito longa, alguém?) a campanha do Bucks foi pro saco e qualquer esforço é como contratar o Sérgio Mallandro para ocupar as vagas do Mussum e do Zacarias nos Trapalhões.
Por outro lado, é o Magic tentando dizer que ainda acredita, que ainda há chances de vencer nessa temporada, mesmo com a lesão do Jameer Nelson. O reserva Anthony Johnson se saiu bem como titular, foram 6 bolas de três pontos contra o Clippers, mas contra times que existem de verdade isso não vai acontecer de novo. Chamar o Tyronn Lue, o jogador que mais tem reserva tatuado na testa e que apesar disso mais jogou partidas como titular em sua carreira, significa que eles querem fortalecer a posição de modo a continuar a campanha rumo ao topo do Leste. Se eles achassem que não dá pra vencer mais sem o Jameer Nelson, não iriam arrumar um jogador que vai sumir no banco quando o Nelson voltar. Mas olha, os sete torcedores do Magic que me desculpem (o nosso leitor, o Fiel, me atualizou do número correto), sem Jameer Nelson não há chance de vencer o Leste, não há chance de chegar numa final do Leste, só há chance do Tyronn Lue ser titular outra vez porque não tem ninguém pra assumir a posição. Engraçado, uns caras bons nunca têm espaço pra jogar, mas o Lue só vai parar em times sem nenhum armador. Ele é sortudo, mas pelo menos não fede. O Morrison era o único da posição no Bobcats e mesmo assim mandaram embora. Deixo aqui, então, meu adeus para o Magic – e também para o Morrison, o jogador com o bigodinho mais bacanudo que a NBA já viu.