>Um sustinho

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Assustado, Gasol correu atrás de um colo amigo

Resultados já esperados nos esportes podem ser bem chatos quando se procura emoção ou partidas históricas, mas é um excelente negócio para um jogo bem no meio de uma madrugada de segunda para terça-feira. Ah, então você estava tirando seu sagrado cochilo quando o Irã enfrentou a Lituânia, a Grécia enfrentou a Alemanha, a Argentinha pegou a Austrália e os Estados Unidos encontraram a Angola? Tudo bem, não tem problema. Os jogos foram como esperado e você não perdeu nada, pode ficar tranquilo com sua consciência e parar de chicotear as próprias costas por ter caído na tentação do seu colchão macio e quentinho e do seu travesseiro acolhedor. Se com isso eu te fiz sentir melhor, pare de ler agora e envie 10 reais para o Bola Presa. Auto-ajuda está na moda.

A partir de agora, o texto traz más notícias para os que dormiram. Croácia e Rússia foi bacana, mas não explodiu os miolos de ninguém. Mas todo mundo deveria ter visto China e Espanha. Simplesmente porque foi histórico. Pateticamente histórico.

Aquela seleção chinesa que começou bem o jogo contra os Estados Unidos, dando um sustinho e mantendo o jogo equilibrando graças a uma infinidade de bolas de três pontos, aguentou o ritmo por muito mais tempo contra a Espanha. Isso pode significar um milhão de coisas, mas eu vou eleger algumas explicações arbitrárias, porque eu quero assim. Primeiramente, a seleção da China não é tão ruim quanto parecia, tem vários jogadores competentes e um plano de jogo estabelecido. Segundo, a pressão defensiva da Espanha nem de longe lembra a pressão feita pelos Estados Unidos. Contra os americanos, os armadores chineses pareciam amadores, cometeram erros absurdos e passaram longos minutos sem sequer conseguir passar do meio da quadra com a bola. Quando a Espanha tentou a mesma coisa, a marcação parecia mais frouxa, os jogadores mais lentos, e aí o armador chinês Liu Wei parecia um gênio capaz de ignorar a pressão e usá-la para seu benefício, deixando na velocidade um marcador para trás e partindo para o ataque completamente livre. Drogas chinesas que aumentaram as habilidades de seus jogadores de um dia para o outro ou a marcação espanhola é coisa de criança frente à dos Estados Unidos?

Além da excelente capacidade de Liu Wei de levar a bola para o ataque, o ala Zhu Fangyu simplesmente fez chover em quadra. Na seleção chinesa, até o mascote sabe arremessar de três pontos, então num dia bom a coisa pode ficar complicada para qualquer equipe. No caso, era o dia de Fangyu e tudo que ele tacava para cima entrava. Eu sou míope e, diabos, estava com um sono absurdo, mas eu podia jurar que após cada cesta de três convertida, Fangyu fazia o tradicional “dedinho do Mutombo“, ou seja, mandava um “não” para alguma coisa ou alguém, que eu não faço idéia do que era. Ao todo, foram 5 gestos e em todas elas eu fiquei com a sensação de que ele nunca deve ter visto um jogo da NBA que não fosse do Yao Ming no Houston e, portanto, tenha visto o Mutombo jogar mil vezes e se apaixonado pelo dedinho mutombiano. E eu que pensava que os chineses não demonstravam emoção em quadra.

As bolas caindo de longe serviram bem para disfarçar uma das piores partidas que eu assisti da carreira de Yao Ming. E olha que isso quer dizer muita coisa – como torcedor do Houston, vi o Yao novato feder bastante e até cair de bunda com um drible do Marbury. Existe alguma relação macabra entre o basquete internacional e o mundo dos pivôs. Todas as estrelas da posição (Bogut, Kaman, Yao, até o Dwight Howard) costumam sair de quadra com um ou dois rebotes, fedem a ponto de alertar a vigilância sanitária e nunca consigo encontrar um motivo qualquer para isso. Com Yao a coisa foi feia mas defensivamente ele fez um bom trabalho, pelo menos sendo grande perto do aro. No ataque, perdeu milhões de bolas, tomou tantas decisões erradas quanto conseguiu e levou três quartos para perceber que quando ele segura a bola mais do que 5 segundos, a defesa o sufoca. Só não foi uma partida mais desastrosa por dois motivos: um é que a China entrou no quarto período ganhando por 14 pontos, e o outro é que o Yao sempre parece um gênio comparado ao Yi Jianlian.

Qual é o maldito problema do Yi? Ele é atlético, explosivo, tem um arremesso perfeito em sua forma e de mira calibrada, mas seu poder mutante é o de passar 40 minutos completamente invisível em quadra. Não recebe a bola, não tenta arremessos, não parte para dentro. Parece aquela mentalidade humilde que aterrorizou Yao Ming no começo de sua carreira na NBA, mas que parece não atazanar todo o resto da seleção chinesa. Cada vez mais, consigo fechar os olhos e imaginar o Yi como um excelente jogador, sem que ele tenha uma partida sequer de grande importância pelo New Jersey Nets.

Enquanto isso, o ex-jogador do Mavericks, Wang Zhizhi (que sempre fedeu em Dallas) simplesmente era incapaz de errar e não tinha receio nenhum em continuar arremessando. Ele parece ter 92 anos e de um modo bizarro parece ser uma versão esticada do Mao Tse-Tung. No quarto período, quando a Espanha enfim começou a reagir na partida, foi o Wang Zhizhi que colocou a responsabilidade nas costas, com grande sucesso. Mas os espanhóis começaram a ficar mais agressivos, lutar por rebotes ofensivos, enterrar o tempo todo (Pau Gasol foi de assustado para bravinho), e o Yao Ming acabou saindo com 5 faltas. Em pouco tempo a vantagem chinesa havia desaparecido e, se não fosse uma bela mãozinha da arbitragem, a Espanha teria vencido no finalzinho do período graças a uma defesa mais pressionada e uma falta de bolas (entenda “bagos”, “culhões”, não bolas de basquete) total dos armadores chineses. Sem Yao em quadra o pânico parecia geral, o pirralho-sensação Ricky Rubio atormentou todas as linhas de passe e poderia até ter vencido a partida num arremesso de último segundo. Quando começou a prorrogação, a seleção da China parecia um bando de pandas assustados. A pressão não era da defesa espanhola, mas da torcida, do governo, da audiência, da cultura, nenhuma bola se atrevou a cair e eles não tiveram a menor chance de ganhar o jogo. No fim, foi o esperado: vitória por 10 pontos da Espanha. Mas o sustinho, a partida histórica da China, deixou tudo especial.

Quando os Estados Unidos pegaram a Angola pouco depois, o jogo da China ainda estava na minha cabeça. Acho que as falhas da equipe americana estão ficando óbvias para todos nós, como os problemas arremessando de 3 pontos, a defesa de perímetro, os rebotes defensivos. A Angola é uma seleção infinitamente mais baixa e que deu um trabalho infernal para os Estados Unidos através de bolas de 3 pontos e uma forte briga pelos rebotes. Diabos, os americanos marcaram por zona durante apenas UMA jogada, sendo que esse seria justamente o modo de neutralizar a principal arma angolana na partida. Então é fácil apontar os defeitos.

Mas acho que estamos ignorando méritos muito óbvios. Os apuros pelos quais passou a Espanha nem ameaçaram acontecer com os Estados Unidos no duelo contra a China. O motivo principal foi a defesa – não a de perímetro, mas a pressão defensiva, as linhas de passe, o esforço para causar o erro, desestabilizar o adversário. Os chineses pareceram amadores contra essa defesa, gênios contra a defesa espanhola.

Justamente por isso, sou obrigado a dizer que os Estados Unidos são ainda mais imensamente favoritos porque podem pressionar qualquer time nessa intensidade ridícula. E também sou obrigado a aplaudir a seleção angolana. Quem lê os comentários do Bola Presa deve ter percebido que temos leitores em Angola que defendem tão apaixonadamente suas seleções, e com razão. Contra os Estados Unidos, o que faltava em altura foi compensada com intensidade e boa pontaria. Manter o ritmo contra os Robocops americanos era impossível, mas esse nem era o objetivo. Na luta pela dignidade em quadra, a Angola saiu vitoriosa e, convenhamos, perdeu de pouco. Eu já sou fã do Mingas, e você?

Agora é que o negócio começa a esquentar. Angola e China, às 3h30 dessa madrugada, é um duelo essencial para decidir o último classificado do grupo. Estados Unidos e Grécia, às 9h, nos dará idéias claras sobre o futuro dos Estados Unidos na competição. Será que os armadores gregos também acabarão parecendo amadores, ou todas as falhas americanas ficarão mais expostas do que nunca?

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