🔒A lição em New York

O futuro do Brooklyn Nets está condenado: sua escolha no tão antecipado draft de 2017 será substituída pela escolha do Celtics, que certamente estará no final da primeira rodada; em 2018 será ainda pior, com a escolha do Nets sendo enviada para o Celtics sem que nenhuma escolha de Boston seja enviada em troca. A situação é ainda pior porque o time precisa desesperadamente de uma reconstrução, estando na última posição da NBA com apenas 12 vitórias em 65 jogos. No Leste, o time em pior situação depois do Nets, o Magic, tem o DOBRO de vitórias. O pior colocado na Conferência Oeste, o Lakers, tem 20 vitórias na temporada até aqui e um núcleo de jovens jogadores para desenvolver num futuro próximo. Não há pior situação do que a do Nets, um desastre sob quaisquer pontos de vista.

É por isso que o Knicks entrou em parafuso quando perdeu ontem para o Nets, apenas a quarta vitória da equipe de Brooklyn contra times da Conferência Leste. O time que tinha expectativas reais de brigar nos Playoffs, e a quem Derrick Rose chamou de “um dos melhores elencos da NBA”, não conseguiu vencer o maior desastre ambulante da Liga no momento em que depende de cada vitória para sonhar com uma vaga cada vez mais distante para a pós-temporada. Com 26 vitórias até aqui e 7 partidas atrás do atual oitavo colocado, o Knicks parece estar tentando ressignificar a definição de “desastre”. Ontem, até o Nets pareceu ter um futuro mais promissor do que seu rival de New York.

Isso se dá porque o Nets, depois do desastre que foi sua tentativa apressada e estabanada de arriscar o futuro para criar um time competitivo do dia para a noite quando seu dono milionário russo assumiu, aprendeu a ter paciência e criou um plano. Sean Marks, o novo General Manager do Nets, só aceitou a nova função depois de garantir que seu projeto é a longuíssimo prazo, que a reconstrução será integral não apenas no elenco mas na estrutura da própria franquia, e que nenhuma ação apressada ou imediatista terá lugar em sua gestão. Foi Sean Marks quem finalmente trouxe uma equipe de análise estatística avançada para a franquia, além de sessões de treinamento exclusivas para cada jogador, uma equipe de psicologia e psiquiatria em tempo integral a serviço da equipe, e uma estrutura física capaz de acomodar as famílias dos jogadores durante treinos, jogos e viagens. Segundo o novo General Manager, todos esses elementos juntam-se para criar um ambiente de “consistência e excelência”, mudam a imagem geral do time para os demais jogadores e passam a impressão de que a equipe sabe o que está fazendo. Resumindo, o Nets possui um PLANO e isso, por si só, é suficiente para que tenhamos que encará-los de maneira diferente. Eles continuam um desastre e a tentativa ejaculação-precoce de construir uma equipe vencedora será uma lição atemporal do que NÃO SE DEVE FAZER na NBA, mas TER UM PLANO já significa que jogadores considerarão a franquia numa futura oportunidade de assinar contratos. Mesmo com 12 vitórias, todos os jogadores parecem felizes e o estilo de jogo está lado-a-lado das melhores equipes na temporada. Em diversas estatísticas, o Nets parece estar caminhando para se jogar basquete de um modo atual, efetivo e funcional. Pode até não estar funcionando – a principal razão é porque o elenco é uma porcaria – mas o Nets certamente está em excelente companhia.

Comecemos pela porcentagem que os arremessos de 3 pontos representam frente à totalidade dos arremessos. O líder da Liga é o Houston Rockets, com quase 47% dos seus arremessos vindo do perímetro – é praticamente METADE de todos os arremessos! – e orgulhosamente o terceiro time com mais vitórias nessa temporada até o momento. Logo abaixo temos o Cleveland Cavaliers, atual campeão da NBA, com 40% de seus arremessos vindo de trás da linha de três pontos. Em seguida temos o Boston Celtics em sua jornada rumo ao topo do Leste. São todos times que venceram mais de 62% dos seus jogos na temporada – e aí em quarto lugar aparece o Nets, zoando a estatística com suas míseras 12 vitórias. Em número bruto de bolas de três pontos convertidas, o Nets fica em companhia parecida: temos novamente o líder Houston Rockets, seguido por Cleveland Cavaliers, Boston Celtics, Golden State Warriors, e aí finalmente o Nets, num glorioso quinto lugar.

Por que o Nets se mantém entre a elite nessas estatísticas mas amarga a última posição na classificação geral? E onde estão Spurs e Wizards, únicos times a vencer mais de 62% de suas partidas a não aparecer no topo da lista de arremessos de três pontos tentados e da de arremessos de três convertidos? A resposta é a mesma: a maravilhosa lista de porcentagem de ACERTO nas bolas de três pontos tentadas. Essa estatística é liderada justamente pelo San Antonio Spurs, que acerta 39.5% das suas bolas de três pontos tentadas, seguido por Cleveland Cavaliers, Golden State Warriors e Washington Wizards. O Clippers, único time que não surgiu em nenhuma das nossas listas a ter também 60% de vitórias, aparece em quinto lugar em aproveitamento de bolas de três pontos. Onde está o Nets nessa lista? Em vigésimo quinto lugar.

Basicamente a elite da NBA aproveita muito bem suas bolas de três pontos ou, no caso do Rockets (que está exatamente no MEIO da lista de aproveitamento, na décima quinta posição), compensa seu aproveitamento chutando quase metade de suas bolas de trás da linha de três pontos e liderando a Liga em bolas de três convertidas. Um dos motivos do Nets perder tanto é que por mais que tente compensar a falta de talento aumentando o número de bolas de três arremessadas, não há ninguém que salve em termos de aproveitamento. Resumindo, o Nets já joga como a elite da Liga – esse é O PLANO – mas ninguém acerta arremessos. Num dia em que acertou metade de suas bolas de longe, para um total de 19 bolas de três pontos convertidas, venceu o Knicks.

Os narradores do Rockets, certamente os analistas esportivos mais CALEJADOS de assistir bolas de três pontos no planeta, perceberam um padrão bizarro: em geral, o time que acerta 15 bolas de três pontos primeiro num jogo vence a partida. Virou uma espécie de “NÚMERO MÁGICO”, e mesmo que seja completamente arbitrário, os narradores começaram a COMEMORAR no instante em que o Rockets acertou sua bola de três de número 15 contra o Cavs, o segundo time com maior volume de arremessos de três da NBA. Curiosamente o Cavs até acertou mais bolas de três do que o Rockets (17 contra 16), mas o Rockets acabou vencendo após acertar a décima quinta primeiro. Se eu contasse a esses narradores que o Nets acertou 19 bolas de três pontos num jogo enquanto o Knicks acertou OITO, eles certamente seriam capazes de deduzir o resultado da partida.

Como torcedor do Rockets e tendo visto mais jogos deles nessa temporada do que qualquer outro time, sinto-me na liberdade de afirmar que, em termos gerais, o time não joga lá muito bem. Há pouca rotação de bola, as jogadas são simples demais, muitos arremessos de três pontos são forçados e sem nenhum tipo de espaço entre o arremessador e os defensores. Os jogadores no elenco não são muito criativos e até mesmo os veteranos erram rotações ofensivas e defensivas. Mas o fascinante é que NADA DISSO IMPORTA porque o elenco é capaz de acertar bolas de três pontos com uma frequência absurda e esses arremessos são, por definição, mais difíceis de defender do que os demais porque são dados em locais com mais espaço na quadra. Se você é um torcedor do Rockets pessimista, dá pra se divertir vendo até onde esse time consegue chegar simplesmente arremessando bolas pouco ou nada pensadas; se você é otimista, pode sonhar com o estrago que essa equipe pode fazer no dia em que APRENDER A JOGAR BASQUETE.

O padrão que vemos nessas estatísticas e nessa anedota é que as bolas de três pontos são um caminho fácil para a elite – não é preciso ser o Spurs, que constrói as melhores oportunidades de arremesso para liderar em aproveitamento das bolas de perímetro, nem ser o Warriors e liderar no número de bolas de três pontos livres arremessadas por jogo; criar algum espaço para Isaiah Thomas, Otto Porter Jr. ou Ryan Anderson já funciona. O Nets está com os dois pés no chão, escolhendo um estilo de jogo acessível e construindo uma equipe de especialistas para ajudar os jogadores a realizarem esse plano tático. Depois de DESTRUIR SEU FUTURO, parece a saída mais sensata para voltar a ser uma equipe de basquete em 2020.

Enquanto isso, o Knicks parece caminhar em sentido contrário. Antes mesmo da derrota para o Nets, Carmelo Anthony havia dado uma entrevista afirmando que ninguém no elenco conseguia entender o motivo deles estarem perdendo tanto, que no vestiário não se encontra uma explicação. Quando a derrota para o Nets veio tal qual uma HECATOMBE NUCLEAR na cabeça da franquia, a cara do futuro da equipe, Kristaps Porzingis, resolveu falar um pouco sobre as derrotas. Segundo ele, o culpado é a CONFUSÃO que assola a franquia “de cima a baixo”. Porzingis reclamou do esquema tático ter mudado uma série de vezes, do famigerado “triângulo” de Phil Jackson ter sido abandonado e retomado, e do fato de que os jogadores não jogam como gostariam, mas sim seguindo a “ideia da vez” para solucionar uma série de problemas que surgem sem parar.

A reclamação vem poucos dias depois de relatos de que Phil Jackson, presidente do New York Knicks, foi ATÉ A QUADRA ensinar o “triângulo” para os jogadores da franquia. E ainda assim, Porzingis afirmou que o conhecimento que os jogadores possuem do sistema ofensivo é “básico”, que eles não entendem direito a movimentação e que o resultado é uma série de jogadas no mano-a-mano, com Carmelo, Derrick Rose e o próprio Porzingis enfrentando seus marcadores individualmente de maneira que ele chamou de “aleatória”.

Acompanhei de perto Phil Jackson comandando Bulls e Lakers que ganhavam campeonatos sem parar, um atrás do outro, e portanto tenho muito respeito e admiração pelo sistema dos “triângulos”, que inclusive teve diversos elementos absorvidos por outros técnicos e outros sistemas táticas, especialmente Steve Kerr no Warriors e Mike D’Antoni no Rockets. Mas é evidente que Phil Jackson e seu New York Knicks estão indo na contramão do resto da Liga ao escolher um sistema tático difícil, complexo, que os jogadores não compreendem, e que exige um tipo mais raro de jogadores – inteligentes, capazes de ler o jogo e improvisar de acordo com as movimentações defensivas – do que os modelos baseados em bolas de três pontos, por exemplo. Ninguém, a não ser James Harden, sabe improvisar pelo Rockets de D’Antoni, mas isso não é necessário. No Knicks, diversos jogadores deveriam ser capazes de entender a movimentação, a rotação e as respostas defensivas – é preciso um elenco de muitos Hardens! – para realmente criar uma equipe imbatível. Some a isso o fato de que o Knicks não tem paciência para juntar esse grupo de jogadores nem de ensinar os jogadores disponíveis na esperança de que se tornem as peças de que a franquia precisa. Numa ânsia de mostrar resultados imediatos – ou, no mínimo, a médio prazo – o Knicks aceita jogadores talentosos, como Derrick Rose, que não necessariamente se encaixam no esquema tático desejado. Se é para usar os “triângulos” de maneira incondicional e pura, como o quer Phil Jackson, que o Knicks mergulhe então nessa jornada, sabendo que por estar na contramão do restante da Liga terá que arcar com as derrotas e pensar a longuíssimo prazo. Se é para abandonar essa proposta, que seja estabelecido um esquema tático que use os jogadores naquilo que possuem de melhor, que use as bolas de três pontos e que angarie arremessadores comuns para espaçar a quadra. Mudando a cada 15 minutos, sem nenhum tipo de plano, sem qualquer comunicação com os jogadores – já que tanto Carmelo quanto Porzingis admitiram que a franquia não fala com eles sobre os planos futuros, deixando-os no escuro – o Knicks não ganhará agora, não chegará aos Playoffs, perderá para o medonho Nets sem entender o que aconteceu, e será incapaz de pensar numa rota de fuga futura. Se continuar assim, em 2020 o Nets será a melhor franquia de New York através de uma lição dura que eles aprenderam na carne: na NBA não existe saída imediata nem tolerância com as equipes que não possuem um planejamento impecável. Quando um time não sabe o que está fazendo, às vezes é hora de olhar para cima: como é que a elite da NBA está jogando?

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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