🔒Bloco de Notas: Lance Stephenson, Cousins, Jokic e Tyler Herro

Voltamos com mais um “Bloco de Notas”, minhas anotações aleatórias da semana sobre os jogos e jogadores que acompanhei mais de perto nos últimos dias. A ideia é que essas anotações possam sempre alimentar outros conteúdos do Bola Presa, de pautas do podcast a textos mais longos posteriores, mas elas aparecem em primeira mão por aqui para vocês assinantes. A ideia é oferecer a vocês uma espiada semanal no que tem me interessado mais na NBA! Vamos lá?


Com a onda de veteranos retornando às quadras para tapar os buracos causados pelo novo surto de Covid, Lance Stephenson está de volta. Foram duas temporadas inteiras afastado da NBA até receber uma chance do Atlanta Hawks, ser dispensado, e então receber mais uma chance do time que o consagrou no início de carreira, o Indiana Pacers. Por conta do elenco dizimado pela pandemia, o Pacers fez mais do que oferecer minutos para Lance Stephenson – como claro sinal de DESESPERO, o time lhe entregou todas as rédeas do time. Nos 6 jogos que disputou pelo Pacers na temporada até aqui, Lance foi o general do Pacers enquanto esteve em quadra, construindo praticamente todas as jogadas em que participou. O resultado disso foi surpreendentemente positivo em duas ocasiões principais: a derrota para o Nets em que Lance fez 30 pontos (20 só no primeiro período) e a vitória em cima do Jazz em que Lance deu 14 assistências (o que permitiu que Domantas Sabonis fizesse 42 pontos, máximo da sua carreira). Com uma temporada em que passou a ser menos protagonista na criação de jogadas do Pacers, Sabonis viu seus números despencarem – até que Lance Stephenson apareceu como o parceiro perfeito de pick and roll, permitindo que ele recebesse a bola em situações melhores de arremesso. Levando isso em consideração, o que explica que Lance Stephenson tenha passado duas temporadas fora da NBA? E que o Atlanta Hawks tenha simplesmente aberto mão de seus serviços ao fim do contrato de dez dias? A resposta não é tão simples de encontrar. Lance certamente é uma FIGURA – tudo que ele faz tem uma cota de marra, firula e deboche, até quando está só batendo a bola -, mas não é exatamente uma figura controversa nos vestiários e já aceitou, em mais de um momento da carreira, assumir papéis de pouco protagonismo e com minutos limitados. O que acredito ser o motivo para os times temerem contratá-lo é o que passo a chamar agora de “Síndrome de Westbrook”: o nível de protagonismo INVOLUNTÁRIO que ele acaba assumindo nas equipes em que está, nas posses de bola em que participa, e que não necessariamente combina com o seu nível de talento ou de habilidade. Lance é um desses jogadores que faz tudo ter a sua cara e o seu estilo, e isso aparece nos números: em seus jogos no Pacers até aqui ele tem um “usage rate” de quase 25% – ou seja, um quarto das jogadas que ocorrem quando ele está em quadra viram um arremesso seu ou um arremesso de alguém que recebeu um passe seu. É um número muito alto para um jogador que, mais do que não ser uma estrela, era um DESEMPREGADO um mês atrás. Não é que ele force essas jogadas, exatamente; acho que é mais uma questão de estilo de jogo, na verdade. Stephenson não é um excelente arremessador do perímetro e quase todas as suas habilidades são relacionadas à criação de jogadas em velocidade, vindas do drible. Para que ele seja minimamente útil, é necessário que ele tenha a bola em mãos e possa tomar decisões – decisões que às vezes são incríveis, mas às vezes não são tudo isso, principalmente porque Stephenson não tem talento bruto o suficiente para sustentar algumas das escolhas que faz em quadra. A questão, então, é a seguinte: ou Stephenson não serve para nada, ou então ele tem as rédeas do time. E quem, em sã consciência, quer dar as rédeas para ele sem que uma pandemia tenha dizimado todas as suas outras escolhas possíveis? Por outro lado, haveria algum jeito de pedir que Stephenson fosse útil sem pedir, com isso, que ele se tornasse um jogador – ou até uma pessoa – completamente diferente do que ele é? Acho que essa “Síndrome de Westbrook” ameaça muitos jogadores, mas vários são simplesmente bons o bastante para que lhes dar as rédeas faça sentido – são os outros que ouvem que precisam mudar, sem que a gente sequer entenda o que isso exatamente quer dizer. Russell Westbrook falou abertamente, esses dias, que entende que ele é quem precisa fazer mais sacrifícios no atual Los Angeles Lakers. A lógica é simples: ele não é bom o bastante para assumir as rédeas do time (especialmente com LeBron James por lá), mas sem as rédeas ele é um jogador muito, muito pior. “Sacrifício”, portanto, seria encontrar maneiras de contribuir abrindo mão das suas preferências, do seu estilo, da sua identidade, do seu protagonismo. Se isso parece coisas demais para se pedir para Lance Stephenson, imagine então para Westbrook – que tem um prêmio de MVP no bolso. Fico me perguntando se isso tudo não é apenas uma questão de ARREMESSO: se Stephenson e Westbrook fossem bons arremessadores de três pontos, especialmente da zona morta, seria muito mais fácil que contribuíssem mesmo sem a bola nas mãos. Mas ainda assim, a que preço? Para que tê-los, se não pela “experiência completa”? E se a experiência não compensa, então não faz sentido mantê-los – como Stephenson, infelizmente, sabe tão bem após tanto tempo fora da NBA.


Outro que tem dificuldade em conquistar um lugar na NBA é DeMarcus Cousins, mas para esse eu não consigo encontrar nenhuma justificativa. Cousins começou a temporada sem nenhum time, mas continuou treinando e tentando convencer equipes de que ele ainda pode ajudar. Conseguiu um treino privado com o Nuggets e com o Bucks em novembro e a equipe de Milwaukee lhe ofereceu um contrato não garantido até o dia 7 de janeiro – para mantê-lo após essa data, seria necessário tornar o contrato garantido até o final da temporada. Cousins certamente aproveitou sua chance: vindo do banco, sem qualquer protagonismo, em minutos reduzidos (menos de 17 por jogo), conseguiu médias de 9 pontos, 6 rebotes e um roubo por partida. Mais do que os números, Cousins ajudou a tapar o buraco deixado por Brook Lopez, lesionado, e manteve o ataque do Bucks respeitável enquanto o elenco era arrasado pela pandemia e por lesões diversas. E aí, às vésperas de ter seu contrato garantido – algo que parecia óbvio, dado o seu sucesso e os elogios do técnico Mike Budenholzer – eis que Cousins foi simplesmente dispensado da equipe. “Fizemos a escolha estratégica de ter uma vaga no nosso elenco antes do fim da janela de trocas”, Budenholzer explicou, antes de apontar como Cousins tinha sido importante para o sucesso do time na temporada até ali. Não foi a primeira vez: Cousins teve passagens curtas mas bem-sucedidas pelo Rockets e pelo Clippers na temporada passada, mas ninguém quis lhe oferecer um contrato de um ano. Mesmo antes da lesão, quando ainda era um jogador de elite, o Pelicans não quis manter Cousins no elenco – o que deixou Anthony Davis descontente e acabou sendo um dos elementos que o fizeram pedir uma troca para o Lakers. E mesmo antes do Pelicans, o Kings que draftou DeMarcus Cousins não fez questão de mantê-lo – mesmo com a NBA criando uma regra nova que permitia ao Kings oferecer contratos mais longos e caros justamente para o Kings conseguir segurá-lo. De um jeito muito estranho, tanto antes quanto depois de sua séria lesão, a história de DeMarcus Cousins é uma história de rejeição contínua, independentemente do que ele faz em quadra. Sua próxima chance agora é em Denver – o outro time que aceitou assistir aos seus treinos privados em novembro do ano passado. Cousins assinou um contrato de dez dias e veremos se, desta vez, o contrato será estendido pelo restante da temporada.


O Nuggets, aliás, precisa de ajuda justamente para substituir Nikola Jokic nos raros minutos em que o pivô vai respirar no banco de reservas. Até o mês passado, o Nuggets era um time de elite em saldo de pontos enquanto Jokic está em quadra (13 pontos a mais que os oponentes a cada 100 posses de bola, quase o dobro do saldo de Warriors, Jazz ou Suns, por exemplo ), mas O PIOR TIME DA HISTÓRIA em saldo quando Jokic vai para o banco (com mais de 15 pontos negativos). Em janeiro esses números são menos extremos (+9 com Jokic, -12 sem ele), mas ainda assim são uma disparidade nunca antes vista numa quadra de basquete. O Nuggets simplesmente não tem um substituto, nem no ataque nem na defesa, para aquilo que Jokic faz em quadra. Claro que parte disso se deve ao fato de que o time está sem Jamal Murray e Michael Porter Jr, então todo o ataque depende de Jokic, mas esse também é um efeito colateral de ter um esquema tático tão profundamente dependente do estilo e das capacidades de um jogador único. Se por um lado isso permite extrair o que há de melhor em Jokic – não é à toa que ele caminha para ter a melhor temporada, em termos estatísticos, de toda a história da NBA -, por outro lado isso força o time a ter que inventar maneiras completamente avulsas de jogar quando ele precisa sentar. O medo de que isso aconteça é um dos motivos, por exemplo, para o técnico Jason Kidd estar tentando “descentralizar” o ataque do Dallas Mavericks, ao mesmo tempo em que coloca mais pressão para que Jalen Brunson emule o estilo de Luka Doncic. Mas Jokic é um caso ainda mais único: qual jogador pode emular o que ele faz? Até mesmo a defesa do Nuggets precisa ser inteiramente montada para acomodar Jokic e, quando ele não está em quadra, o desenho tático precisa ser inteiramente reconsiderado. Claro que DeMarcus Cousins não conseguiria substituir Jokic à altura, mas basta não ser HORROROSO para que os números do Nuggets sem Jokic melhorem um pouco – e é só isso que falta para que o Nuggets comece a subir na tabela, algo importante para que os especialistas considerem mais seriamente Jokic para o prêmio de MVP da temporada.


Enquanto alguns times tentam “descentralizar” seus ataques, outros caminham na direção contrária. Acho que nenhum time mudou tanto seu estilo de jogar ao longo da temporada quanto o Miami Heat. Com Bam Adebayo tanto tempo fora e Jimmy Butler também tendo perdido vários jogos, o Heat acabou dando mais minutos para jogadores, digamos, um pouco OBSCUROS: Gabe Vincent, Max Strus e Caleb Martin jogaram, todos, mais de 30 partidas nessa temporada, com média de mais de 20 minutos por jogo – Omer Yurtseven, com 15 minutos por jogo, está quase lá. Em 41 jogos, o Heat já usou CATORZE quintetos titulares diferentes, uma aberração só possível por um time enfrentando uma pandemia e que consegue encontrar talento em qualquer lugar. Mas é claro que lidar com tanta variação e com tantos jogadores diferentes exige algumas concessões, e a concessão maior foi o livro de jogadas do Miami Heat. Erik Spoelstra certamente deve ter ficado enlouquecido com a quantidade de posses de bola em que, tentando seguir os seus preceitos ofensivos, o elenco do Heat estourava o cronômetro de 24 segundos sem conseguir sequer TENTAR um arremesso. Não encontrei uma estatística para estouros de cronômetro de posse, mas imagino que o Heat ser o sexto time que mais comete turnovers a cada 100 posses de bola tenha algo a ver com isso. Nas últimas semanas, no entanto, isso tem mudado: o Heat tem distribuído menos a bola, rodado menos a bola pelo perímetro, e tem se concentrado mais em jogadas simples de pick and roll. É uma simplificação bastante drástica do que o Heat costumava fazer com o ataque, e que depende de uma “centralização” do ataque num único jogador – agora responsável por usar os corta-luzes para arremessar ou tentar passes simples. O Heat com isso tenta muito mais arremessos contestados, mas está sendo muito mais objetivo no ataque e, o principal, desperdiçando menos a bola. O plano tem dado resultado, o Heat chegou a conseguir a segunda colocação do Leste, e o mais fantástico é que nada disso seria possível sem os avanços evidentes de Tyler Herro. Agora oficialmente um armador “centralizador”, desses que carrega a bola e faz toda a movimentação ofensiva acontecer, Herro está tendo um tipo de responsabilidade que parecia completamente incompatível com o jogador que vimos em sua primeira temporada de NBA, quando era basicamente um arremessador. Em termos de estilo – ainda que não em talento, claro – Herro agora é um jogador aos moldes de Doncic e Trae Young, jogadores com os quais ele queria ser comparado quando falou sobre os avanços que fez na offseason. Os avanços físicos foram os mais evidentes a princípio, mas o controle de bola e a capacidade de costurar as defesas é o que realmente permitiu que ele assumisse a atual função no Heat, e nada disso estava aí duas temporadas atrás. Herro é mais uma história do Miami Heat tirando o melhor de seus jogadores, e o esquema tático ser simplificado para fazer uso de Herro é a prova máxima disso: não há dogma maior, na comissão técnica, do que fazer os jogadores renderem. Até mesmo alguns preceitos ofensivos, antes intocáveis, agora parecem secundários perto disso.

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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