🔒Os tocos do Golden State Warriors

No dia 8 de dezembro o Golden State Warriors deu 15 tocos na vitória em cima do Detroit Pistons. Na partida anterior haviam sido 12 tocos contra o Charlotte Hornets de Dwight Howard. Três jogos antes disso e o Warriors distribuía 11 tocos contra o Orlando Magic. Ao todo foram 11 partidas com 10 tocos ou mais para o Warriors em apenas 29 jogos disputados. Não à toa a média de tocos por jogo da equipe até aqui é de 8.5 – a melhor da temporada com larga vantagem, e muitíssimo perto da maior média de tocos de TODOS OS TEMPOS, os 8.7 por partida conquistados pelo então Washington Bullets na temporada 1985-86. Motivos não faltam para acreditarmos que o Warriors possa inclusive bater essa marca. Para termos uma ideia, a equipe já liderou a NBA em tocos por jogo na temporada passada, mas com “apenas” 6.8 – enquanto a média em dezembro alcançou 8.6 tocos por partida, quase dois a mais do que a média anterior. A evolução da equipe no quesito é visível e constante.

Essa marca histórica em tocos acontece, entretanto, sem nenhum grande pivô protegendo o aro. JaVale McGee, o maior pivô da equipe em estatura com 2,13 m, joga menos de 8 minutos por partida e tem médias de míseros 0.7 tocos por jogo. David West, que também joga de pivô pela equipe, tem apenas 2,06 m de altura e sua média de tocos nos 14 anos de carreira na NBA não chega a um toco por jogo. O pivô responsável por fechar o caminho para a cesta é, na maior parte do tempo, Draymond Green e seus 2,01 m de altura. Numa geração em que os pivôs gigantes foram valorizados pela capacidade exclusiva de tapar o aro com seus tocos, o Warriors lidera a Liga com o diminuto Draymond Green, atualmente o décimo segundo colocado em tocos com 1.4 por jogo, e a ajuda inusitada de um jogador de perímetro: Kevin Durant, no melhor ano defensivo de sua vida, está em segundo lugar em tocos na temporada com a assustadora marca de 2.1 tocos por partida.

Sob comando do assistente técnico Ron Adams, a defesa do Golden State Warriors é inteiramente focada não em jogadores gigantes e explosivos que tentem tapar o aro, mas sim em jogadores de braços longos, muita envergadura, muita ajuda defensiva e arremessos contestados ANTES que a bola possa chegar muito perto da cesta. É por isso que o Warriors deu O DOBRO de tocos em arremessos de média e longa distância do que qualquer outro time da NBA nessa temporada. Sem ninguém intimidante para tapar o aro, o plano é contestar as bolas de longe e colocar o máximo possível de braços longos no caminho de qualquer jogador rumo à cesta.

O resultado dessa estratégia não é apenas um time que lidera em tocos sem ter que colocar pivôs de ofício em quadra, mas também a liderança em pontos de contra-ataque: são 22.2 pontos por partida, bastante acima dos 15.5 do segundo colocado, o Lakers de Luke Walton que tanto pretende emular o jogo bem sucedido da equipe de Golden State. Mas talvez mais importante do que esses contra-ataques seja o efeito psicológico que essa política de tocos causa no adversário: o técnico Steve Kerr já falou abertamente que os outros times apressam arremessos contra seu time, piorando seu aproveitamento mesmo quando os defensores do Warriors ainda não estão a postos. Kerr pode falar dos malefícios de temer tocos por experiência própria: depois de uma série de tocos em contra-ataque do Cavs nas Finais de 2016, o Warriors passou a hesitar antes de qualquer bandeja, exagerar nos passes e apressar os arremessos, numa situação que deu à equipe de Cleveland a vantagem psicológica que os carregou rumo ao primeiro título da NBA.

O que o Warriors faz, agora, é levar esse pesadelo sentido na carne para todos os adversários, todos os dias. A defesa está cada vez mais entrosada e assumidamente mais afinada com as orientações de Ron Adams, mas a presença de braços mais longos – especialmente os de Kevin Durant, que diz ter 2,06 m de altura mas provavelmente está mais perto de 2,11 m – é fator fundamental para a melhora. A vantagem do esquema é que Durant, que se finge de baixinho justamente para não ter que ficar no garrafão, NÃO PRECISA ser um protetor de aro para ser eficiente nesse modelo que apenas usa seus braços longos na cobertura ou como apoio para criar caos nas infiltrações adversárias. Não é necessário que ele atue como um pivô tradicional, de modo que ele pode ficar onde deseja – e onde é verdadeiramente efetivo. Nesse esquema, Durant deixou de ser um defensor completamente mediano para se tornar uma máquina de dar tocos. Nessa temporada já teve até mesmo um jogo em que deu SETE tocos, incluindo dois deles SEM UM DOS SAPATOS, pra mostrar que vestir roupas é DISPENSÁVEL:

Para exemplificar como esse esquema de ajudas sem um pivô tradicional funciona – e como ele beneficia jogadores de defesa pouco convencional como Kevin Durant e Draymond Green – separei um jogo em particular do Warriors, os 15 tocos em cima do Pistons no começo do mês de dezembro, recorde da temporada até aqui. Vamos acompanhar em vídeos, abaixo, cada um dos tocos do Warriors na partida, com comentários para mostrar quais escolhas defensivas estão sendo feitas para que esses tocos aconteçam.


Começamos logo de cara, então, com DOIS TOCOS na mesma jogada, um de Shaun Livingston e outro de JaVale McGee:

 

Vejam que a jogada é toda desenhada para que Shaun Livingston pense que Tobias Harris vai receber um passe no perímetro e que na verdade Avery Bradley receba a bola cortando para a cesta, mas Draymond Green protege tão bem a linha de três pontos que Livingston tem tranquilidade pra se antecipar e acompanhar Bradley no garrafão. Seus braços longos são suficientes para contestar o arremesso e McGee abandona imediatamente Andre Drummond para dar outro toco na cobertura. O Warriors já dita o tom: quando a defesa acerta a movimentação defensiva e acompanha os cortes dos adversários, se coloca em posição para dar tocos sem precisar de pivôs atléticos. Até o armador, no lugar certo, consegue interferir em um arremesso de curta distância. Bônus: o toco gera um contra-ataque de Kevin Durant, que acelera para fazer a cesta e ainda sofrer a falta.

O vídeo abaixo também mostra o posicionamento impecável do Warriors:

 

Acima vemos que a infiltração de Reggie Jackson, que parecia um contra-ataque, é imediatamente interrompida por TRÊS jogadores do Warriors ao mesmo tempo. Vejam que McGee e Green já estão pulando de braços levantados antes mesmo de Jackson sequer sair do chão, tirando qualquer espaço para que o arremesso aconteça. Esse “sanduíche” do Warriors é um dos motivos pelos quais os times acabam ficando no perímetro contra eles e tendo que arremessar no final do cronômetro de arremesso – nesse caso, Tobias Harris dá um arremesso contestado e forçado, mas converte.

Abaixo vamos para nossa terceira jogada:

 

Andre Drummond rejeita o arremesso de média distância (não é o forte) e tenta bater para cima de McGee, mas a pegadinha está no fato de que um defensor do Warriors quase nunca está sozinho: Durant abre mão da zona morta para simplesmente ficar no garrafão, levantar os braços e atrapalhar. Seu toco não exige sequer um pulo, pois é fruto de uma ajuda defensiva e de quatro braços incomodando a movimentação de Drummond. Bônus: o toco vira um contra-ataque IMPECÁVEL em que Klay Thompson erra uma bola de três pontos completamente livre.

Nosso quarto vídeo, abaixo, talvez seja o toco mais impressionante, com Jordan Bell pregando Tobias Harris:

 

O motivo pelo qual Jordan Bell chega a tempo nesse toco é que em momento algum ele teme que Tobias Harris arremesse de três pontoss, ele está inteiramente pronto para contestar a infiltração. Essa confiança se dá porque Kevin Durant e seus braços gigantes estão no perímetro, caçando Harris na movimentação. Assim que Harris abre mão do arremesso, Durant passa a marcar Drummond e então Bell tem segurança para contestar a bandeja.

O vídeo abaixo é o mesmo caso. Começa com uma movimentação defensiva PERFEITA do Warriors, e olha que o Pistons se movimenta o tempo inteiro no ataque de maneira inteligente. O Warriors faz todas as trocas corretamente, segue todos os cortes e limita as opções. Eventualmente Avery Bradley finalmente fica em condição para um arremesso. Mas vejam que lindo: Draymond Green NÃO SAI para marcá-lo no perímetro, confiando que Durant, que está na linha de três pontos, é comprido o bastante para alcançá-lo. Quando Bradley infiltra, então, Green está perfeitamente posicionado para desviar o arremesso sem nem ter que pular muito:

 

Agora no vídeo abaixo temos um gostinho de como o Warriors defende pivôs gigantes quando eles estão sem nenhum jogador da posição em quadra. No caso o gigante Boban Marjanovic, com 2,22 m de altura e 2,40 m de envergadura, enfrenta o diminuto David West, mas rapidamente Nick Young chega para ajudar na dobra de marcação:

 

Boban dá o passe certo para o jogador livre, mas percebam acima que Draymond Green percebe o passe alguns segundos antes e tenta se livrar de seu marcador para correr para o perímetro. Mesmo atrapalhado ele chega a tempo de dar mais um toco para sua coleção.

No vídeo abaixo é a vez de Andre Drummond tentar uma jogada de costas para a cesta contra Kevin Durant, e o resultado é hilário:

 

Pode contar: quando Drummond tenta o arremesso, o Warriors tem QUATRO jogadores dentro do garrafão e um quinto se aproximando. O toco acaba sendo do Durant que só está com o braço levantado, nem se esforçou, tamanha é a BAGUNÇA que Drummond precisa enfrentar quando se aproxima da cesta. Bônus: o toco gera um contra-ataque horrível do Livingston, que escorrega no chão só pra descontrair.

Abaixo, mais um toco na conta do garrafão tumultuado: Stanley Johnson desiste do arremesso porque está cercado por dois defensores e abre mão da bola para Drummond, longe demais da cesta e bem defendido por McGee.

 

A jogada abaixo é daqueles para fazer qualquer um entrar no fã clube do Draymond Green, o toco dele é até pequeno perto de tudo que ele faz em termos de posicionamento:

 

Primeiro ele impede um passe para o Boban só por estar POR PERTO, pronto para fechar o pivô adversário num sanduíche com David West. Depois ele manda o Quin Cook pro perímetro para ele poder acompanhar uma infiltração, e por fim pega a infiltração do Tolliver com um toco – pouco depois de indicar para o Iguodala substituir ele na defesa da zona morta. Green dá esse toco simplesmente porque estava no lugar certo numa jogada em que o Pistons podia jurar que o Tolliver iria cortar para a cesta livre, coitado.

A de baixo é mais simples: o Warriors defendeu perfeitamente a posse de bola inteira, de modo que o Pistons só tinha 4 segundos no cronômetro e o Green, claro, se antecipou ao arremesso, contestando uma bola de três pontos:

 

Tocos em arremessos de três pontos são muito raros, então é importante ver como Green consegue realizar a proeza simplesmente entendendo qual vai ser a jogada adversária.

A de baixo também é puro posicionamento: Green simplesmente não cai no corta-luz de Andre Drummond. Por quê? Porque sabe que o que lhe cabe é defender seu lado esquerdo, o caminho para a cesta, e que do outro lado do corta-luz estará Kevin Durant:

 

Não tendo que se preocupar em lutar contra o corta-luz, Green pode ou contestar o arremesso no perímetro ou, como ele faz acima, perseguir a infiltração rumo ao toco.

Abaixo, uma rara jogada de mano-a-mano, já que o resto da defesa do Warriors não chega a tempo: Durant é obrigado a contestar Drummond sozinho. A solução é tirar o corpo, deixar Drummond girar, e aí usar a envergadura para o toco. Green chega um tanto atrasado e quase consegue um segundo toco na jogada, mas acaba cometendo a falta:

 

Abaixo, mais um toco de Kevin Durant, que antecipa a jogada, dá o toco numa bola de três pontos e ainda corre para o contra-ataque fácil:

 

Vejam acima que Durant só corre para o perímetro, se antecipando, DEPOIS que Draymond Green corre desesperado para defender o garrafão, indo cobrir um possível passe para o Andre Drummond. Quando a troca de marcação é perfeita, é mais fácil chegar a tempo de um arremesso, mesmo que ele seja de longa distância.

Pra encerrar nossa análise – e o jogo – uma jogada típica da defesa do Warriors, que começa com DUZENTAS MÃOS atrapalhando a bola, Shaun Livinston se recuperando rapidamente após dobrar a marcação na bola (olha que MARAVILHA ele e o Klay Thompson não tendo nenhuma dúvida sobre quem vai e quem fica), e Kevin Durant aparecendo na cobertura porque Green está de olho em Drummond, pra variar:

 

Fez as contas? São 5 tocos de Kevin Durant, 6 tocos de Draymond Green, 2 tocos de JaVale McGee, um toco para Shaun Livingston e outro para Jordan Bell. Nenhum deles é fruto de um jogador que está sempre parado na frente da cesta, mas sim de um sistema completamente coletivo, trocas defensivas perfeitas, braços longos e muita, muita ajuda defensiva. Se o ataque do Warriors ficou famoso, aqui está sua defesa para provar que é tão ou mais impressionante – ficaremos de olho na média histórica, que se for batida coroará uma tática defensiva responsável por liberar o Warriors para ser um time mais leve, mais rápido, sem pivôs estabanados e com Kevin Durant o mais longe do garrafão quanto possível.

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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