🔒Rotação para os Playoffs

“Você usa 8 jogadores na rotação”, disse o então técnico do Knicks, Pat Riley, a respeito dos Playoffs. “Mas você coloca pra jogar de verdade 7, usa apenas 6 e confia apenas em 5”. A frase é o exemplo perfeito da mentalidade que acomete as equipes da NBA no momento em que os Playoffs se iniciam. Embora bancos profundos e reservas produtivos sejam celebrados durante toda a temporada regular, há algum consenso no fato de que esses reservas importam menos quando a pós-temporada começa. O primeiro indício de que os times já estão apertando as rédeas com cerca de 15 jogos restantes na temporada foi a declaração do técnico do Denver Nuggets, Michael Malone, que anunciou publicamente que Isaiah Thomas não fará mais parte da rotação da equipe.

Thomas jogou apenas 9 partidas desde seu retorno às quadras, após 11 meses parado por uma séria lesão no quadril. Mostrou lampejos de sua agressividade, velocidade e habilidade em quadra, mas suas médias de arremesso – 37% de aproveitamento, incluindo 27% nas bolas de três pontos – somadas aos seus problemas defensivos deixaram claro que sua melhora e o encaixe com o time não seriam imediatos. Das 9 partidas em que participou até aqui, em apenas 3 seu time fez mais pontos do que sofreu enquanto ele esteve em quadra. A suposta necessidade de se “encurtar a rotação” para os Playoffs, no entanto, encerrará aqui a passagem de Isaiah Thomas pelo Nuggets. Com um contrato de apenas um ano, assinado justamente para que ele pudesse “provar seu valor” na pós-temporada quando se recuperasse da lesão, Isaiah ficará parado até a próxima temporada – e, sem ter provado coisa alguma, terá que contar com a boa vontade de alguma equipe para lhe oferecer um contrato qualquer.

O elenco do Nuggets é realmente profundo, especialmente desde o retorno de Will Barton (que está jogando 28 minutos por jogo), a ascensão do segundo-anista Monte Morris (com 24 minutos por jogo) e a consolidação de Trey  Lyles e Torrey Craig (ambos beirando os 20 minutos por jogo). Ao longo da temporada, 11 jogadores acumulam mais de 18 minutos por partida no Nuggets – com 15 minutos por jogo, Isaiah Thomas seria apenas a décima segunda opção da equipe. Se levarmos a sério a afirmação de Pat Riley, de que times nos Playoffs deveriam usar apenas 8 jogadores, Isaiah realmente não tem espaço – além dele, outros TRÊS jogadores precisariam ceder seus lugares na rotação. No entanto, por que deveria ser necessário cortar tantos jogadores talentosos na hora mais importante da temporada? Por que não ter esses jogadores como opções importantes no banco durante os Playoffs? É verdade que os times realmente reduzem suas rotações na hora do aperto?


 

Para termos uma noção das rotações dos times nos últimos anos, busquei a média de jogadores por equipe com mais de 10 minutos de média por partida. Abaixo de 10 minutos, assumo que o jogador não é de fato um reserva participativo – apenas tapa buracos e joga partidas que já estejam mais ou menos decididas. Na temporada 2016-17, cada time usava em média 13.5 jogadores com mais de 10 minutos por jogo. Como cada elenco pode ter 15 jogadores mas apenas 13 estão disponíveis para entrar em quadra a cada jogo, podemos assumir que em geral todos os jogadores disponíveis tendem a jogar pelo menos 10 minutos. Nos Playoffs de 2016-17, no entanto, a média de jogadores com mais de 10 minutos por jogo caiu para 9.8 – um número que também é inflado pelo fato de que alguns reservas que normalmente não são chamados à quadra ganham muitos minutos em partidas decididas por uma diferença muito grande de pontos.

Na temporada passada a redução das rotações foi ainda mais gritante: na temporada 2017-18 tivemos 14.4 jogadores por equipe com 10 minutos ou mais de média por jogo; nos Playoffs esse número despencou para 9.3. Isso é curioso principalmente por conta das equipes que foram mais longe na pós-temporada passada: Steve Kerr afirmou que não faria reduções de rotação no Warriors por “acreditar em todo seu elenco”; Tyronn Lue afirmou que usaria uma rotação de 10 jogadores no Cavs por conta da “profundidade e versatilidade do elenco”; e o Boston Celtics se destacou ao longo da temporada justamente por ser um dos times mais profundos, em que reservas aleatórios podiam entrar em quadra e parecer grandes estrelas. Mesmo com essas situações em que deveríamos esperar mais jogadores diferentes em quadra, as rotações foram encurtadas em comparação com a temporada regular.

Nas Finais da Conferência Leste entre Cavs e Celtics, o time de Boston usou apenas 7 jogadores com 10 minutos ou mais nos Jogos 2, 4, 5, 6 e 7. As únicas exceções foram o Jogo 1 (em que o Celtics colocou 8 jogadores em quadra) e o Jogo 3 (em que o time usou 10 jogadores numa derrota de lavada que gerou muitos minutos “desimportantes”). No Jogo 7, o decisivo da série, o Celtics teve 2 jogadores acima dos 40 minutos e outros 5 acima dos 30 minutos. Ou seja, a profundidade foi sendo “abandonada” – fosse por conta de lesões, fosse pela “importância” do momento.

O mesmo aconteceu com o Cavs: nos 3 primeiros jogos da série, usou 9 jogadores acima dos 10 minutos por partida; no Jogo 4 e no 6 diminuiu a rotação para 8 jogadores; e no decisivo Jogo 7 foram apenas SEIS jogadores, incluindo 3 acima dos 40 minutos, LeBron James jogando todos os 48 minutos da partida e o único reserva acima dos 10 minutos sendo Kyle Korver, que jogou apenas 17. Na hora do aperto, até mesmo o Cavs optou por deixar seus titulares em quadra o máximo possível.

Nas Finais da Conferência Oeste tivemos um fenômeno similar. Ao contrário da temporada regular, o Warriors usou apenas 8 jogadores na sua rotação com 10 minutos ou mais nos Jogos 1, 2, 4, 5, 6 e 7 – a única exceção, o Jogo 3, foi uma lavada em que, por conta do tempo inútil de jogo, o Warriors usou um jogador a mais. O Rockets do técnico Mike D’Antoni, famoso por encurtar suas rotações ao máximo até mesmo na temporada regular, usou apenas 7 jogadores nos Jogos 2, 4, 5 e 6; 8 jogadores no Jogo 1; e SEIS jogadores no decisivo Jogo 7, depois da lesão de Chris Paul. No Jogo 4 o Rockets usou 4 jogadores por mais de 40 minutos e ainda assim se recusou a usar mais do que dois reservas na partida.

Nas Finais da NBA entre Cavs e Warriors, o Jogo 1 foi para a prorrogação, ou seja, existiam mais minutos disponíveis. O resultado foi que o Cavs usou 9 jogadores com mais de 10 minutos e o Warriors usou 8 – o que implicou em 4 jogadores do Warriors jogando mais de QUARENTA E CINCO MINUTOS na partida. Ao longa da série – uma varrida histórica por parte do Warriors – o Cavs oscilou entre 8 e 9 jogadores; o Warriors entre 7 e 8, tirando o Jogo 2 que foi uma lavada tão surreal que o Warriors chegou a usar 10 jogadores para matar tempo.


 

O San Antonio Spurs de 2013-14 é um caso emblemático para analisarmos rotação na pós-temporada. Campeão da NBA em 2014, o time fez história como o primeiro a não ter nenhum jogador com mais de 30 minutos por jogo na temporada regular. Ao todo DEZESSEIS jogadores daquele time faziam parte ativamente da rotação, jogando pelo menos 10 minutos por partida, enquanto os líderes de minutos (Tony Parker, Kawhi Leonard e Tim Duncan) ficavam em quadra 29 minutos por jogo. Nos Playoffs, entretanto, a rotação encolheu PRA VALER: considerada “profunda” para os moldes da época, o Spurs teve apenas 9 jogadores com 10 minutos ou mais na pós-temporada – 7 jogadores foram cortados efetivamente da rotação. A “magia” do Spurs foi que os minutos foram realmente divididos entre esses 9 jogadores: Patty Mills, o que menos entrava, jogava 15 minutos por jogo; Tim Duncan, o que saía menos de quadra, não chegou aos 33 minutos por partida.

Isso nos mostra que mesmo os times que mais distribuem seus minutos ainda assim usam menos jogadores do que o usual na temporada regular. A aparência de coletividade do Spurs vinha da distribuição, não da quantidade de jogadores; times como o Warriors e o Celtics até chegaram a mudar suas escalações de uma série para a outra nos Playoffs da temporada passada, mas isso não os impediu de limitar o número de jogadores que eram acionados a cada série. Até os técnicos que recusam a “mentalidade Pat Riley”, com discursos inclusivos sobre todo o elenco ter que contribuir rumo ao título, confiam apenas numa parcela de seus elencos para os momentos cruciais.

Os motivos comuns para os técnicos encurtarem suas rotações são famosos: na teoria titulares deveriam ser os melhores jogadores do elenco, e nos Playoffs é possível – ou mais necessário – mantê-los mais tempo em quadra. Sem jogos em dias consecutivos (ou sequências de 3 jogos em 5 dias), os jogadores tem mais tempo de se restabelecer após uma partida cansativa e, portanto, podem aguentar mais tempo em quadra. Rotações mais curtas também permitem que os técnicos mantenham mais sob controle suas pretensões táticas e, supostamente, a “química” e o encaixe entre os jogadores. Aqueles que criticavam esses encurtamentos alegavam que bancos maiores oferecem mais chances de surpreender os adversários com alguma peça ou combinação inusitada para a qual os técnicos rivais não teriam resposta.

Na prática, entretanto, não é o que temos visto nas últimas séries dos Playoffs. Jogadores que possuem menos minutos nos times jogam menos por um motivo: oferecem benefícios pontuais às suas equipes que ainda não anulam suas deficiências com a frequência necessária. Com a evolução das estatísticas avançadas, esses jogadores deixaram de ser “surpresas” nos Playoffs para se tornarem ALVOS a serem explorados pelos adversários. Se um jogador como Isaiah Thomas adiciona um elemento de imprevisibilidade no ataque que apenas eventualmente compensa suas deficiências defensivas, na pós-temporada times entram em quadra com esquemas táticos complexos preparados APENAS para explorar essas deficiências – e isso CASO Isaiah entre em quadra, por exemplo. Na prática os times estão BABANDO para que os reservas mais especializados – um jeito super fofo de colocar no currículo o fato de que você SÓ FAZ UMA COISA, ou que fede em alguma outra fundamental – entrem em quadra nem que seja por meia dúzia de minutos, porque trata-se de uma chance de rodar aquelas duas ou três jogadas específicas para explorá-los. Se um técnico está tão desesperado por um encaixe a ponto de ter que colocar um reserva do final da sua rotação, isso quer dizer que o time adversário VENCEU: forçou seu oponente a ter que apelar para uma arma MAIS FRÁGIL, mais explorável, que seu time estará preparadíssimo para surrar. No fatídico Jogo 7 das Finais da NBA de 2016, quando o Cavs se sagrou campeão, o técnico Steve Kerr deu 18 minutos somados para Anderson Varejão e Festus Ezeli, jogadores que entravam pouco e que, naquele momento, pareciam “armas secretas” para injetar no Warriors altura, força e resistência no garrafão. Nesse curto período em que estiveram em quadra no Jogo 7, o Warriors tomou DEZONOVE pontos a mais do que fez – se levarmos em conta que o placar final teve uma diferença de apenas 3 pontos, podemos perceber que esses jogadores especialistas mas defensivamente limitados foram explorados o bastante pelo Cavs para acabarem contribuindo com a derrota num jogo de placar apertado. Usar seus melhores e mais completos jogadores  ao invés dos especialistas eventuais costuma ser a escolha padrão, especialmente para os rigores de um decisivo Jogo 7.

O mito do “jogador surpresa”, aquele jogador “desconhecido” que entra em quadra e incendeia o jogo, não sobrevive aos tempos atuais: temos dezenas de scouts, olheiros especializados, analisando cada partida de cada equipe na temporada regular e nos Playoffs; estudos detalhados sobre as jogadas e as rotações; analistas de vídeo que dissecam as limitações de cada jogador; treinadores específicos para desenhar maneiras de explorar cada deficiência – e de esconder as próprias. Para um jogador surpreender os adversários ele precisa, primeiro, surpreender O PRÓPRIO TIME, e ter recebido uma chance às cegas de fazê-lo justamente no momento mais crítico da temporada. Não parece muito plausível justamente na era do CONTROLE, da preparação, da programação, da rigidez das planilhas, das análises e dos números. Some isso ao fato de que jogadores nunca estiveram tão bem preparados fisicamente graças aos avanços da medicina esportiva: uma rotação de 7 homens gera uma média de 34.2 minutos por partida para cada jogador, o que é um PASSEIO NO PARQUE para atletas que hoje investem milhões de dólares para ter os corpos mais capacitados e condicionados possíveis.

É claro que nada disso anula a importância de um banco profundo, especialmente na temporada regular quando cansaço e lesões possuem um papel fundamental na colocação das equipes. Nos Playoffs, um banco profundo também dá ao técnico mais opções de quais sete, oito ou nove jogadores usará a cada série. No entanto, mais do que 9 jogadores parece contrariar aquilo que temos visto na pós-temporada nos últimos anos e criar mais confusões (jogadores a serem explorados, brigas por minutos, falta de entrosamento, disputas nos vestiários) do que dividendos para as equipes. Infelizmente nessa temporada, dada a demora para voltar de lesão, não haverá espaço para Isaiah Thomas num time com peças demais para os Playoffs, portanto. Jogadores sabem disso, estão cientes do encurtamento das rotações, e não há muito o que fazer. A temporada regular serve, também, para que os jogadores consolidem seus lugares no seleto grupo que participará da pós-temporada – dessa seletiva, Isaiah sequer conseguiu participar.

 

Torcedor do Rockets e apreciador de basquete videogamístico.

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